domingo, 10 de outubro de 2010

O BRASIL NOITE

Acordo cedo e durmo tarde, a madrugada não é meu lugar, preciso de luz natural, não fotografo bem com flashes, não quero que me revelem, me escondo na claridade, onde todos se parecem.
Diurna, mas nem tão entusiasmada que goste do som de Elba Ramalho, Ivete Sangalo, Daniela Mercury. É onde minha brasileirice destoa, não sou de pular e jogar os braços pra cima, entrar no clima de qualquer festa, subir em trem elétrico. Até gosto de verde, mas amarelo, detesto.


Fico meio avexada quando leio sobre a nova Daslu, sobre os novos namorados de celebridades geradas do nada, entediada com fotos de debutantes, geração xerox, todas exatamente iguais, nem os pais as reconhecem, onde você aparece, minha filha? Ninguém aparece, todos se repetem.


O Brasil colorido, suado, tropical, cartão-postal é o país onde nasci, mas me desenvolvi no avesso, numa clareira interna, invisível para quem está de fora. Da porta pra dentro ouço solos de guitarra e não preciso me vestir tão bem. De dia, meu país de fato brilha, mas onde eu me reconheço é no silêncio, na rua estreita, no aconchego da minha intimidade, onde dou de comer aos meus sentimentos. Difícil ser brasileira sem fazer barulho, sem ter pernas para mostrar, sendo agridoce e não salgada do mar.
Mas sou brasileira, e esta crônica nada mais é do que um reconhecimento de nacionalidade após ouvir o mais recente disco do Lobão, Canções dentro da noite escura, em britânicas, porém brazucas, saídas de uma página arrancada da nossa história, a parte em que somos sortudos, carentes, suicidas, apaixonados, inquietos, dramáticos - não melodramáticos.


A alegria é uma conquista, é até mais importante do que a felicidade, mas alegria não é grito, não é aeróbica, não é refrão, não é pegadinha, não é pegação. Alegria é amar. E enfrentar a dor sem perder a poesia. Alegria é caminhar, não correr. Dar umas paradas a fim de ganhar tempo. Viver sem culpa. Ter um pouco de noite no seu dia. E muito dia no seu sono.
O disco será considerado bom por alguns, e ruim por outros. É assim com todos os discos, livros, filmes: eles capturam o freguês ou o deixam escapar. Fui de certa forma capturada, ganhei um greencard pra continuar no meu país sem precisar aderir ao ziriguidum e às festas no apê, um green-yellow card que me fez lembrar que há vida intensa na sombra também.


Martha Medeiros


Decidi colocar esta crônica aqui porque li e acabei me identificando em alguns pontos. Ando com a cabeça cheia de informação, isso não ajuda na hora de escrever. Preciso comprar um processador melhor para minha cabeça. Espero que gostem. Grande Beijo.


Lia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário